- Eu estava indo e voltando, resolvendo pendências do curso, mas nesse período tive que ficar no confinamento. No dia em que ia comprar passagem para voltar para a aldeia, não vendiam mais. Estou aqui no Rio, tentando escrever, ler, aproveitando esse confinamento, mas estava sentindo muita dor no peito, crises de choro, não sei o que deu em mim. Desde dezembro fiquei no hospital com meu ex-marido doente na UTI em coma, minha filha com bebezinho, muita coisa que estava enfrentando, estava carregando muita coisa nas minhas costas. Me deu um negócio bem estranho, deve ser por causa do confinamento, só saio para comprar comida. Entrei num surto, não estou me sentindo bem...pedi ajuda. Está difícil. Queria ficar na aldeia, mas não consegui mais. O corpo não aguenta o confinamento. Tentei ficar tranquila e concentrada, mas está difícil.
- Obrigada pelas palavras, hoje estou mais tranquila. Estava sentindo muita dor no peito. Depois que recebi muitas mensagens de pessoas, conversas, aliviou. Alguns parentes vieram trazer comida, fazer as coisas pra mim, como aldeia mesmo. Na aldeia sempre tem fogueira, a gente conversa, fuma, conta piada, história. Agora e aqui, tudo vem à tona com muita força. Estou melhor. Vou buscar outra forma de me fortalecer. - Estou acostumada a viver confinada em certos lugares, mas o confinamento que faz a gente pirar não é o confinamento indígena, porque nós temos nossas regras. Este confinamento é na cidade, num lugar totalmente diferente, sem chão. O lugar onde pode ficar confinada sem pirar é com chão. A angústia vem por causa disso. Quero saber de você, como você está enfrentando, fico preocupada com as amigas, com as pessoas que eu gosto. Te ouvir agora fiquei mais aliviada também. Transcrição de mensagens áudio recebidas por Bruna Franchetto, com autorização da autora. Sandra Benites [[email protected]], da etnia guarani nhandewa, é doutoranda do PPGAS/MN/UFRJ. Seu atual projeto de pesquisa trata da vidas das mulheres guarani e tem como título: “Mulher falando: fundamentação do teko tekohaa partir da visão das nhandesy kuera do Mato Grosso do Sul, mostrando várias facetas kunhangue reko”. Os comentários estão fechados.
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AutoresAna Cláudia Teixeira de Lima, PPGHCS/COC/Fiocruz Arquivos
Novembro 2020
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